22 de novembro de 2010

L'incommunicabilità de Antonioni e O Eclipse


"A incomunicabilidade é o que se retém da obra de Michelangelo Antonioni. As suas temáticas são a inconstância do amor e os problemas da vida em comum de um casal, os desejos carnais associados à solidão da alma, os problemas de identidade (...) Precursor, o seu verdadeiro tema é o homem moderno, a sua angustia existencial e a sua incapacidade de criar laços duradouros com os outros. É dizer que o cinema de Antonioni nos fala de hoje.”
Stig Bjorkman,  Colecção Grandes Realizadores do Público,
em colaboração com os Cahiers Du Cinema, Nº24

Aquilo que de alguma forma pode caracterizar o método de Antonioni é já não a experiência - mas o que resta das experiências passadas, o que vem depois, quando tudo foi dito. Os filmes de Antonioni parecem não ter uma acção propriamente dita, ou seja, não acompanhamos a acção e as suas consequências, parece que acompanhamos apenas as consequências ou efeitos, por assim dizer. Quis-se muitas vezes encontrar a unidade da sua obra nos temas já feitos da solidão e da incomunicabilidade, como característica da miséria do mundo moderno. 

Contudo, Antonioni não critica o mundo moderno, nas possibilidades do qual ele “acredita” profundamente: critica no mundo a coexistência de um cérebro moderno e de um corpo fatigado. De tal maneira que a obra passa fundamentalmente por um dualismo que corresponde aos dois aspectos da Imagem-Tempo de Deleuze: um cinema do corpo, todos os cansaços do mundo e a neurose do mundo, as suas cores suscitadas por um novo espaço-tempo, as suas potencias multiplicadas pelos cérebros artificiais. Segundo as teorias de Deleuze, a unidade da obra de Antonioni é a confrontação do corpo-personagem com a sua lassidão e o seu passado. E do cérebro-cor com todas as suas possibilidades futuras, mas os dois compondo um só e mesmo mundo, o nosso, as suas esperanças e o seu desespero. Podemos salientar 3 características no cinema de Antonioni: os tempos mortos, a forma como trabalha os espaços e a noção de identidade das personagens, que parecem ter uma espécie de “identidade em fuga”.

O Eclipse começa apresentando-nos uma mulher ( Monica Vitti) e um homem cuja história de amor termina. É o fim de uma longa noite em branco. Onde somos transportados para todo o “depois”, o vazio, onde tudo já foi dito e onde deambulamos com os personagens em desconforto, como se já nada mais houvesse a fazer.

Chegámos a um fim, e conseguimos senti-lo, a aparente calma deles incomoda-nos, esperamos incessantemente pelo “adeus”, pela decisão de um deles em abandonar aquela história. Vemos Monica Vitti e um homem sem iniciativa. Poucos filmes conseguiram captar as despedidas entre dois amigos amantes de uma forma tão dolorosa e imprevisível como o fez O Eclipse.

Aqui, é a obscuridade que se impõe para concluir numa última imagem que atordoa e apaga. Este filme é sem dúvida uma experiência - para a qual temos de estar dispostos a ter um papel activo - porque não existe uma linha de acção que nos encaminhe para uma interpretação óbvia e pré-determinada. A interpretação é um processo muito mais afectivo do que racional, de associação ou encadeamento, cada cena imprime um sentimento ou reforça o das cenas anteriores. O quotidiano repete-se, transborda cansaço, nada acontece, não há nada que possamos esperar que aconteça a não ser o vazio total.

O que mais me agrada, são estas personagens que Antonioni cria, personagens que se mantêm vivas pela força da sua imperfeição. São mais os defeitos de carácter do que as virtudes que as colocam na nossa memória. E esta luta por uma busca de sentido para a vida e para as relações amorosas num mundo moderno, cinzento e desgastante, são lembranças constantes da fragilidade do homem e demonstram-nos o quão complicado é penetrar na alma humana e ter uma visão total da mesma, principalmente em cinema. 


Bárbara Moura 
Nº627